
A suposta profecia que voltou a circular nas redes sociais e em grupos de fiéis, após a notícia da morte do Papa Francisco nesta segunda-feira (21), é atribuída a São Malaquias, um monge irlandês nascido Maol M’Aedhóg Ua Morgair, que viveu entre 1094 e 1148. Arcebispo de Armagh. Malaquias teria recebido uma visão mística em que via todos os futuros papas da Igreja Católica, desde Celestino II até o último, identificado como “Petrus Romanus” – ou Pedro, o Romano.
Segundo o manuscrito, que ficou conhecido como “Profecia dos Papas”, essa lista conteria 112 pontífices. O Papa Francisco seria o último da sequência, o 112º. Cada papa é descrito com frases simbólicas curtas, geralmente em latim. O último trecho da profecia é o mais sombrio:
“Na perseguição final da Santa Igreja Romana, reinará Pedro, o Romano, que apascentará seu rebanho em meio a muitas tribulações, após as quais a cidade das sete colinas será destruída, e o Juiz terrível julgará o povo.”
A origem do texto e o salto para o século XVI
Apesar de São Malaquias ter vivido no século XII, a profecia só apareceu pela primeira vez séculos depois, em 1595, quando foi publicada pelo monge beneditino Arnold de Wyon. Isso alimentou suspeitas sobre sua origem. Há historiadores e teólogos que acreditam que o texto foi forjado no século XVI com intenções políticas.
Em 2024, um documentário sobre o Papa Sisto V (1585–1590) voltou a reacender o debate. O conteúdo sugere que o próprio Sisto V poderia ter escrito ou encomendado o texto e apenas atribuído a Malaquias. O reinado de Sisto V ficaria aproximadamente no meio da lista dos papas previstos, e algumas interpretações alegam que o fim do mundo, segundo a cronologia do manuscrito, aconteceria 442 anos depois de seu papado – ou seja, em 2027.
Francisco, o último?
Com a morte do Papa Francisco nesta segunda-feira (21), as atenções se voltaram novamente para o conteúdo da profecia. Mesmo que o nome “Pedro” não esteja diretamente ligado ao papa argentino, o fato de ele ter escolhido o nome Francisco — em referência a São Francisco de Assis, um santo fortemente associado a simbolismos proféticos — levanta interpretações variadas.
Além disso, Papa Francisco frequentemente se pronunciava sobre temas de grande preocupação global, como a crise ambiental, os conflitos armados e a perda de valores espirituais — tópicos que, para alguns, têm um forte tom apocalíptico.
Há quem acredite que o próprio Papa Francisco seja o último papa; outros, que o sucessor dele é quem encerrará a lista; e há ainda quem diga que o tal “último” será uma figura de liderança com legitimidade contestada, especialmente se a eleição do próximo papa ocorrer em meio a crises.
As críticas e os céticos
Entre os estudiosos mais céticos, a voz mais proeminente é a do jesuíta francês Pe. Claude-François Ménestrier. Em 1689, ele publicou o livro Réfutation des Prophéties faussement attribuées à S. Malachie sur les élections des Papes, no qual desmonta a autenticidade da lista. Seus argumentos são diretos:
- Por 450 anos, ninguém nunca mencionou essa profecia. Nenhum historiador medieval ou renascentista fez referência a ela.
- Não há documentação confiável mostrando como o texto chegou até Arnold de Wyon.
- A lista inclui não apenas papas legítimos, mas também antipapas, como Vítor IV (1159-64), Nicolau V (1328-30) e Clemente VII (1378-94). Para Ménestrier, seria uma blasfêmia sugerir que Deus teria confundido papas e antipapas em uma revelação.
- A suposta data do fim do mundo depois do pontificado de Francisco contraria o que diz a própria Bíblia, que afirma que “ninguém sabe o dia nem a hora” do Juízo Final (cf. Mt 24,36; Mc 13,32; At 1,7).
- As descrições da profecia são bastante específicas até o papa Urbano VII. Depois disso, tornam-se genéricas e poderiam ser atribuídas a qualquer pontífice com características comuns como “varão religioso”, “fogo ardente”, “fé intrépida” etc.
- Ménestrier conclui que as profecias provavelmente foram escritas por volta de 1590 e falsamente atribuídas a São Malaquias.
Esses argumentos também são sustentados por teólogos contemporâneos como Dom Estêvão Bettencourt, monge beneditino brasileiro que escreveu extensivamente sobre o tema no opúsculo Fim do mundo? A profecia de São Malaquias.
Por O Bemdito